11.12.09

Sucessão

Entristeceu-se profundamente com a notícia da morte do avô. Era a primeira vez que teria que lidar com a morte de alguém - que nem era tão próximo, mas que era muito querido. Já haviam falecido outros parentes mais distantes e amigos da família, mas, apesar da insistência dos telejornais, a mãe tentava mantê-lo afastado do tema delicado - ao menos até aquela cinzenta manhã de chuva fina.

Após vestir a melhor roupa de domingo e, por cima dela, o casaco vermelho de gorrinho, entrou no carro calado e seguiu cabisbaixo durante as duas horas de estrada. Por vontade própria não falaria uma palavra, mas respondia monossilabicamente as perguntas da mãe, que tentava consolá-lo.

Ao chegarem à capela da pequena cidade, muitos dos parentes já estavam por lá. Também já estavam presentes no velório muitos dos amigos do seu Alfredo: o pessoal da bocha, a turma dos bingos e dos jantares dançantes (as pessoas eram as mesmas, só trocavam os dias, com bingo na quinta e baile no sábado) e, por fim, os que jogavam truco e dominó na praça (essas turmas eram diferentes e, inclusive, como dizia o seu Alfredo, que costumava apaziguar os ânimos, disputavam as mesinhas a unhas e dentaduras).

Quando pararam o carro e o garoto desceu, os amigos do seu Alfredo, compadecidos com a presença da criança, viraram-se para ele com os olhares bondosos de quem cuida. Observando a cena, o garoto lembrou-se do ano anterior, quando havia morrido o cãozinho que ele tinha desde quando nem se lembrava. Recordou-se que, no dia seguinte ao do atropelamento, a mãe o levou à loja de animais. Naquele momento, percebendo-se em meio a dezenas de opções, respirou fundo e sorriu, reconfortado.

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