24.12.20

O carbono de que somos feitos

Naqueles tempos, as chamas queimavam a olhos vistos, por dias e noites, por meses a fio

E havia ainda aqueles dispostos a incendiar-se, pôr a mão ao fogo, a fim de descobrir de que combustível eram feitos: madeira grossa, cepo úmido, que fumegaria aos poucos a casca e pronto; ou lenha seca e rachada, que consumiria-se plenamente, às cinzas

Havia sempre novas chamas, aqui e acolá, de propósito ou por descuido. Enquanto o céu, tomado de fagulhas e fuligem, ansiava por novos ventos e por chuva, para que a estiagem e o fogo dessem vez, enfim, a novo período de esperança.

25.6.20

Pasárgada

O tempo devorou meus sonhos bucólicos.

Pasárgada tornou-se um balneário, repleto de turistas com paus de selfie, lives e hashtags.

Não se faz mais uma refeição decente por menos de 200 patacas, que é quase meio salário dos que ali trabalham; mas que não moram mais ali, pois o aluguel também subiu após a renovação do centro histórico e os polpudos contratos para a temporada.

Agora, os trabalhadores de Pasárgada moram do outro lado do rio, nos manguezais, em palafitas amontoadas e abalroadas. No tempo das monções, a água, a lama e o óleo das embarcações invadem as casas. O rei sempre lamenta muito, mas lamenta enquanto banqueteia-se cercado por seus novos amigos: os grandes empresários que incentivam o turismo, que administram o porto e que movimentam a economia local.

Vou-me embora de Pasárgada, mas não sei se resta para onde ir.

29.3.20

Revista Subtextos

Está no ar a 1ª Edição da Revista Subtextos, na qual foi publicado o conto A cada um seu fardo.


A revista está disponível para download no site gratuitamente: http://www.escritorbrasileiro.com.br/subtextos

6.3.20

Revista Escritor Publicado

O conto “A cada um seu fardo” foi selecionado para publicação na primeira edição da revista do projeto Escritor Publicado - http://escritorpublicado.com.br/

Levando em conta a média de caracteres e palavras dos meus textos, este é um conto longo. Deve até ultrapassar uma lauda!

16.2.20

Estática

Todas as noites, no horário do jornal, sentava na poltrona no meio da sala, ligava o rádio e propositalmente tirava-o de sintonia

Naqueles tempos inconstantes e nebulosos, a estática, um caos ordenado, mensurável, cientificamente explicável, era a única coisa capaz de mantê-lo são

7.1.20

Arquétipos

No palco, o fantoche grita
“eu sou um menino de verdade”
estalando o pé de madeira
sobre as tábuas nobres do palco

Títere e titereiro confundem-se
em uma figura singular e pitoresca
- melodramática

Os fios da trama estão ridiculamente expostos

mas o público simplesmente ignora
e embarca em histórias fantasiosas


Não há ninguém por trás das cortinas,
pois não é mais necessário

O espetáculo criou vida
e segue crescendo
- incontrolável